Entra em vigor lei que cria debêntures de infraestrutura

Publicado em 22 de Janeiro de 2024 em Boletins

 

Nova lei cria importante arcabouço legal para atração de recursos de investidores institucionais locais e estrangeiros para a infraestrutura nacional

 

Em 10 de janeiro de 2024 entrou em vigor a Lei nº 14.801, sancionada em 9 de janeiro de 2024 (“Lei 14.801/2024”), que criou as debêntures de infraestrutura (“Debêntures de Infraestrutura”), viabilizando a oferta de juros remuneratórios mais atrativos ao mercado e, assim, atraindo investidores locais e estrangeiros para projetos de infraestrutura de longo prazo no país.

 

Inicialmente, vale esclarecer que as debêntures criadas pela nova Lei não substituem os títulos criados sob a Lei nº 12.431/2011 (“Debêntures Incentivadas”), cujo maior beneficiário é o investidor pessoa física, com a alíquota zero de imposto de renda. Essas Debêntures Incentivadas continuarão existindo, de forma complementar e paralela às Debêntures de Infraestrutura. Já nas Debêntures de Infraestrutura, o benefício fiscal é concedido ao emissor do papel.

 

Características

 

Algumas características dessa nova modalidade de debêntures, dentre elas algumas em comum com as Debêntures Incentivadas, são:

 

  • Emissor: deve ser sociedades de propósito específico, concessionárias, permissionárias, autorizatárias ou arrendatárias, constituídas sob a forma de sociedade por ações, e/ou suas respectivas sociedades controladoras diretas ou indiretas.

  • Distribuição: pública.

  • Destinação: implementação de projetos de investimentos na área de infraestrutura ou de produção econômica intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação considerados como prioritários na forma regulamentada pelo Poder Executivo.

  • Prazo para emissão: até 31 de dezembro de 2030.

  • Remuneração: por taxa de juros pré-fixada vinculada a índice de preço ou à Taxa Referencial (TR), vedada à pactuação total ou parcial de taxa de juros pós-fixada.

  • Prazo médio ponderado: superior a quatro anos.

  • Recompra e Liquidação Antecipada: vedação à recompra do valor mobiliário emitido pelo próprio emissor ou parte a ele relacionada nos dois primeiros anos após a sua emissão, bem como liquidação antecipada por meio de resgate ou pré-pagamento, observadas as regras e exceções dispostas na Resolução nº 4.751 do Conselho Monetário Nacional.

  • Compromisso de Revenda: inexistência de compromisso de revenda assumido pelo investidor.

  • Prazo de pagamento periódico de rendimentos: com intervalos de, no mínimo, 180 dias.

  • Registros: comprovação de que o valor mobiliário esteja registrado no BACEN e na CVM.

  • Vedação por pessoas ligadas à emissora: As Debêntures de Infraestrutura não poderão ser adquiridas por pessoas ligadas à sua emissora, inclusive àquelas residentes ou domiciliadas no exterior, sob pena de multa equivalente a 20% do valor das debêntures e dos rendimentos delas decorrentes. A emissora também responderá solidariamente pela multa em casos de dolo, fraude, conluio, simulação ou abuso de forma jurídica ou deficiência de substrato econômico.

  • Procedimento simplificado alocação de recursos: limite de lookback de 60 meses para reembolso de custos e despesas incorridos com o projeto (transição gradual de 24 para 60 meses em 3 anos), o qual entra em vigor no trigésimo sétimo mês seguinte ao da publicação da nova Lei, conforme período de transição abaixo:

 

Prazo legal permitido para o reembolso:

 

  • 24 meses da data do encerramento da oferta pública -> entrada em vigor em 10 de janeiro de 2024 (data de publicação da Lei nº 14.801/2024).

 

  • 36 meses da data do encerramento da oferta pública -> entrada em vigor em 10 de fevereiro de 2025 (13º mês contado da data de publicação da Lei nº 14.801/2024).

 

  • 48 meses da data do encerramento da oferta pública -> entrada em vigor em 10 de fevereiro de 2026 (25º mês contado da data de publicação da Lei nº 14.801/2024).

 

  • 60 meses da data do encerramento da oferta pública -> entrada em vigor em 10 de fevereiro de 2027 (37º mês contado da data de publicação da Lei nº 14.801/2024).

 

A nova Lei nº 14.801/2024 será objeto de regulamentação bienal pelo Poder Executivo, sendo a primeira regulamentação prevista para 9 de fevereiro de 2024 (30 dias após a publicação da Lei, que ocorreu em 10 de janeiro de 2024).

 

Tratamento fiscal

 

Como acima mencionado, as Debêntures de Infraestrutura criadas pela nova Lei não substituem os títulos criados sob a Lei nº 12.431/2011, inclusive as Debêntures Incentivadas, que conferem ao investidor pessoa física a incentivada alíquota zero de imposto de renda. Essas debêntures continuarão existindo, de forma complementar e paralela às debêntures de infraestrutura da nova Lei. Contudo, diferentemente das Debêntures de Infraestrutura, os rendimentos auferidos por investidores das novas Debêntures de Infraestrutura ficam sujeitos à tributação por meio da retenção do imposto de renda na fonte (“IRRF”), segundo as alíquotas da tabela regressiva, aplicáveis para as aplicações financeiras de renda fixa, a saber: 22,5% até 180 dias; 20% de 181 a 360 dias; 17,5% de 361 a 720 dias; e 15% a partir de 721 dias.

 

O imposto retido na fonte será considerado: (i) como antecipação daquele devido na declaração anual, no caso de pessoa jurídica tributada com base no lucro real, presumido ou arbitrado; ou (ii) como tributação definitiva, no caso de pessoa física e de pessoa jurídica optante pela inscrição no Simples Nacional ou isenta. A tributação na fonte, contudo, não se aplica às instituições financeiras, inclusive sociedade de seguro, previdência e capitalização, sociedade corretora de títulos, valores mobiliários e câmbio, sociedade distribuidora de títulos e valores mobiliários ou sociedade de arrendamento mercantil.

 

Já os rendimentos decorrentes das Debêntures de Infraestrutura pagos, creditados, entregues ou remetidos a investidores estrangeiros ficam sujeitos ao IRRF de 15% ou, excepcionalmente, de 25% caso o beneficiário seja residente ou domiciliado em país ou dependência com tributação favorecida e por beneficiário de regime fiscal privilegiado.

 

Contudo, se os rendimentos forem auferidos por fundos isentos no resgate, na amortização e na alienação de cotas ou na distribuição de rendimentos, a alíquota do IRRF será de 10%, tais como o Fundo de Investimento em Participações em Infraestrutura (FIP-IE) e o Fundo Incentivado de Investimento em Infraestrutura (FI-Infra).

 

Por outro lado, a nova Lei nº 14.801/2024 visou buscar para o financiamento de infraestrutura outros investidores, particularmente os fundos de pensão, tradicionais parceiros da infraestrutura no resto do mundo, mas que ainda participam pouco dos financiamentos no Brasil (com exceção para o setor de energia).

 

Como esses investidores não se sujeitam ao imposto de renda, novos incentivos precisaram ser criados para a sua atração. Assim, a nova debênture traz uma diferença estrutural, ao alocar ao emissor o benefício fiscal por cinco anos, prazo esse passível de avaliação anual de acordo com a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

 

O benefício criado permitirá ao emissor, além de deduzir a despesa com os juros pagos, também excluir da determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL um valor correspondente a 30% da soma dos juros relativos às debêntures. A ideia é que essa economia fiscal seja levada em consideração pelo emissor para aumentar as taxas de juros das debêntures, de forma a torná-las mais atrativas ao investidor.

 

Debêntures com variação cambial e Bonds Incentivados

 

Além dos fundos de pensão, a nova Lei também buscou criar mecanismos para atrair recursos internacionais. A nova norma também passou a permitir a captação de recursos para projetos considerados como prioritários pelo Poder Executivo Federal via emissão de bonds estrangeiros com lastro na Lei 12.431/2011 (“Bonds Incentivados”), bem como a emissão de debêntures com indexação à taxa cambial e estruturas que incluam emissão de títulos-espelho no exterior. 

 

Nessas estruturas, a companhia emite as debêntures, sob lei brasileira, que são subscritas por empresa do grupo com domicílio no exterior. Essa empresa estrangeira, por sua vez, emite bonds lastreados nas debêntures brasileiras, em formato mais habitual para investidores estrangeiros. Essa estrutura foi utilizada em alguns poucos projetos no Brasil, mas em reais. A permissão para que as debêntures sejam indexadas permitirá atingir um pool bem maior de investidores.

 

Além das disposições referentes às debêntures, a nova Lei trouxe também a alíquota zero da Lei nº 9.481/1997, aos juros decorrentes de emissão de títulos no mercado internacional para implantação de projetos na área de infraestrutura, considerados como prioritários. Nesse caso, não haveria emissão de debêntures no mercado nacional, mas diretamente um bond no formato internacional. Nesse caso, no entanto, não se aplica o benefício de exclusão de 30% dos juros na determinação do lucro real.

 

Fundos de investimentos

 

Essa nova Lei, que alterou o Marco Legal das Debêntures Incentivadas e do Fundo de Investimento em Participações em Infraestrutura (FIP-IE), do Fundo de Investimento em Participação na Produção Econômica Intensiva em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (FIP-PD&I), e do Fundo Incentivado de Investimento em Infraestrutura (FI-Infra), veio em momento oportuno dado que o Novo Marco Regulatório de Fundos de Investimento (Resolução CVM nº 175) entrou em vigor recentemente, a partir de 2 de outubro de 2023, e trouxe, entre inúmeras novidades relevantes, (i) a possibilidade de segregação de patrimônio em fundos e a limitação de responsabilidade de cotistas ou investidores, sendo um importante passo, muito aguardado principalmente por investidores estrangeiros, que enxergavam com insegurança jurídica a falta de limitação de sua responsabilidade em fundos de investimento, e (ii) a sujeição à alíquota de 10% de IRRF dos rendimentos decorrentes das debêntures de infraestrutura, quando auferidos por fundos isentos no resgate, na amortização e na alienação de quotas ou na distribuição de rendimentos, como antes mencionado.

 

FIP-IE e FIP PD&I

 

  • SPEs elegíveis: passam a ser elegíveis para investimento pelos FIP-IE e FIP-PD&I as SPEs já constituídas em razão da celebração de contrato de concessão, permissão, arrendamento ou autorização de empresa com entidade pública.

  • Projetos elegíveis: passam a incluir também as outras áreas consideradas prioritárias pelo Poder Executivo Federal, na forma da Lei nº 12.431/2011.

  • Prazo de enquadramento: o prazo para início das atividades do fundo passa de 180 para 360 dias, contados do registro de funcionamento concedido pela CVM, e o prazo para atendimento dos requisitos mínimos de enquadramento previstos na Lei nº 11.478 passa de 180 dias para 24 meses.

 

FI-Infra

 

  • Limites de enquadramento: o percentual de 85% que o fundo deve manter em ativos de que trata o artigo 2º da Lei nº 12.431 (e que pode ser de 67% nos primeiros 2 anos contados da data da primeira integralização de cotas) deixa de incidir sobre o patrimônio líquido e passa a incidir sobre o valor de referência do fundo.

  • Alteração da definição de valor de referência: definido como “menor valor entre o patrimônio líquido do fundo e a média do patrimônio líquido do fundo nos 180 dias anteriores à data de apuração”. A alteração permite uma maior flexibilidade durante o período de formação da carteira do FI-Infra.

 

Projetos prioritários ambientais

 

A emissão de Debêntures de Infraestrutura, assim como as Debêntures Incentivadas, destinadas exclusivamente a projetos de investimento que geram relevantes benefícios ambientais ou sociais, será objeto de avaliação externa específica para esse tipo de emissão, devendo seguir procedimento simplificado de tramitação, objeto de análise prioritária em relação a projetos que não geram benefícios ambientais ou sociais.

 

As debêntures têm sido fundamentais para o desenvolvimento da infraestrutura. Em 2022, por exemplo, foram captados mais de R$ 40 bilhões em debêntures para projetos nos mais variados setores. Para além do volume, esse título oferece prazos mais longos (de 15 a 20 anos), essencial para projetos de longo prazo. A participação de pessoas físicas, embora bem-vinda, cria também alguns desafios, especialmente na fase inicial dos projetos, em que desvios de rota podem acontecer (aumentos de custos, mudanças de contrato), e waivers são necessários.  O aumento da participação de investidores com maior porte e mais ambientados à realidade dos projetos é há muito tempo desejado pelo mercado.

 

Para acessar a íntegra da Lei nº 14.801/2024, clique aqui.

 

Nossos times também têm acompanhado de perto as mudanças regulatórias e a evolução das debêntures incentivadas junto ao mercado de capitais, estando à disposição para prestar esclarecimentos nesse e em outros assuntos.

 

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Governo Federal amplia o rol de setores prioritários autorizados a emitir debêntures incentivadas

 

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Publicação produzida pela(s) área(s) Tributário, Mercado de Capitais, Infraestrutura e Energia