COVID-19 | Mercado de Capitais - CBIOs

Publicado em 04 de Maio de 2020 em Boletins

Mercado de Capitais - texto atuaalizado em 30/04 às 17h52

CRÉDITO DE DESCARBONIZAÇÃO POR BIOCOMBUSTÍVEIS (CBIO)

Foi anunciado, no último dia 27 de abril de 2020, o início da negociação e do registro do chamado Crédito de Descarbonização por Biocombustíveis (CBIO) na B3 - Brasil, Bolsa, Balcão. O CBIO é um instrumento financeiro e ambiental registrado sob a forma escritural, constituído para fins de comprovação da meta individual do distribuidor de combustíveis, e surge como crédito decorrente da Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio), que visa à produção sustentável de biocombustíveis no Brasil, de modo a beneficiar o consumidor mediante a garantia do abastecimento e da oferta de combustíveis mais baratos.

Segundo o Ministério de Minas e Energia (MME), o CBIO beneficia também os produtores de biocombustíveis que buscam formas mais eficientes de produção e, consequentemente, poluem menos o meio ambiente. Alcançado o objetivo, estaríamos diante de um “ganha-ganha”, em benefício mútuo da cadeia produtora, distribuidora e consumidora.

O RenovaBio também busca atender ao compromisso assumido pelo Brasil na 21ª Conferência das Partes (COP21) das Nações Unidas sobre Mudança Climática, em Paris, com o objetivo de fortalecer a resposta global à ameaça da mudança do clima e de reforçar a capacidade dos países de lidar com os impactos dali decorrentes – o chamado Acordo de Paris.

O CBIO foi instituído pela Lei nº 13.576, de 26 de dezembro de 2017, que objetiva estabelecer metas compulsórias anuais de redução de emissões de gases causadores do efeito estufa para a comercialização de combustíveis. O CBIO é emitido pelo produtor ou importador certificado de biocombustível, correspondendo cada unidade de CBIO a uma tonelada de emissão de carbono que deixa de ser emitida no meio ambiente, calculada a partir da diferença entre as emissões de gases de efeito estufa no ciclo de vida de um biocombustível e as emissões de seu combustível fóssil substituto.

O MME detalha em sua página o processo de emissão do crédito, que tem início na Plataforma CBIO, desenvolvida pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), que, por sua vez, formata o lastro do CBIO – chamado de PRÉ-CBIO – a partir das notas fiscais emitidas pelo emissor primário (produtor ou importador de biocombustível) certificado, observadas as regras da Resolução ANP nº 802/2019.

A emissão do CBIO é realizada por uma instituição financeira (escriturador), mediante a solicitação do emissor primário. O escriturador, então, inclui a oferta de venda do CBIO na plataforma de negociação da B3, por meio da qual os investidores poderão fazer a aquisição do ativo.

Com relação às metas de redução de emissões de gases causadores do efeito estufa para a comercialização de combustíveis, elas são compulsórias e anuais, devendo observar: (i) a proteção dos interesses do consumidor quanto a preço, qualidade e oferta de combustíveis; (ii) a disponibilidade de oferta de biocombustíveis por produtores e por importadores detentores do Certificado da Produção Eficiente de Biocombustíveis; (iii) a valorização dos recursos energéticos; (iv) a evolução do consumo nacional de combustíveis e das importações; (v) os compromissos internacionais de redução de emissões de gases causadores do efeito estufa assumidos pelo Brasil e ações setoriais no âmbito desses compromissos; e (vi) o impacto de preços de combustíveis em índices de inflação.

A meta compulsória anual estabelecida será desdobrada, para cada ano corrente, em metas individuais, aplicadas a todos os distribuidores de combustíveis, proporcionais à respectiva participação de mercado na comercialização de combustíveis fósseis no ano anterior. Em caso de não atendimento da meta individual, o distribuidor de combustíveis ficará sujeito a multa, proporcional à quantidade de Crédito de Descarbonização que deixou de ser comprovada, que poderá variar, nos termos do regulamento, entre R$ 100.000,00 (cem mil reais) e R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais), sem prejuízo de outras sanções de natureza administrativa, civil e penal, conforme aplicável.

A identificação da quantidade de CBIOs a ser emitida considerará o volume de biocombustível, produzido ou importado, e comercializado pelo emissor primário, observada a respectiva Nota de Eficiência Energético-Ambiental constante do Certificado da Produção Eficiente de Biocombustíveis do emissor primário, conforme definido na Lei nº 13.576/2017.

Nessa esteira, o Decreto nº 9.888, publicado em 28 de junho de 2019, atribuiu ao Comitê Nacional de Política Energética (CNPE) a definição das metas de descarbonização anuais, recomendadas pelo Comitê RenovaBio, para um período de 10 (dez) anos, tendo a Resolução CNPE nº 15/2019 estabelecido a meta de 28,7 milhões de CBIOs para o ano de 2020.

Naturalmente, o momento atual de enfrentamento da pandemia de COVID-19 não deixou de impactar também os planos e as metas estabelecidos do RenovaBio, e, como consequência, impôs mais uma série de desafios aos participantes e afetados diretamente pela nova regulamentação, notadamente pela redução da demanda no setor de produção e importação de biocombustíveis e de distribuição de combustíveis.

Os distribuidores de combustíveis, para quem a aquisição do CBIO é compulsória, em meio ao atual estado de calamidade pública em função da pandemia de COVID-19, podem estar diante de exigência impossível de ser cumprida, tendo em vista a ausência de garantias de que será efetivada a comercialização de biocombustíveis em volume suficiente para gerar a quantidade necessária de CBIOs, a fim de atender a meta compulsória de redução de emissões.

Nesse contexto extraordinário e excepcional, o MME, na condição de coordenador do Comitê da Política Nacional de Biocombustíveis (Comitê RenovaBio), publicou uma Nota pela qual informou ter avaliado e reconhecido que seria prudente promover a rediscussão das metas de descarbonização estabelecidas, especialmente para este ano de 2020. O processo respeitará os trâmites previstos na Regulamentação do RenovaBio, que envolve, segundo o MME, a reavaliação das propostas no âmbito do Comitê RenovaBio, as quais serão levadas a Consulta Pública e, posteriormente, culminarão na deliberação do Conselho Nacional de Política Energética.

A discussão, todavia, não impede o início da negociação dos CBIOs, cuja forma de negociação está prevista na Portaria MME nº 419/2019, de modo que os empreendedores que tiveram as suas produções de biocombustíveis certificadas poderão negociar o CBIO no mercado organizado e registrar as operações no ambiente da B3. Todo investidor, nacional ou internacional, poderá adquirir o CBIO.

Outra novidade relacionada e que impacta as novas emissões de CBIO é a conversão recente da Medida Provisória (MP) nº 897, de 2019, na Lei nº 13.986, que entrou em vigor no dia 07 de abril de 2020 e é conhecida como a “Nova Lei do Agronegócio”. 

A MP nº 897 previa em seu texto a alteração da lei do RenovaBio para estabelecer que a receita auferida até 31 de dezembro de 2030 do emissor primário, que é o produtor ou importador de biocombustível habilitado a solicitar a emissão de CBIOs, ficasse sujeita à incidência do imposto sobre a renda (IRPJ) exclusivamente na fonte à alíquota de 15% (quinze por cento), com exclusão das receitas do cálculo do lucro real ou presumido e do resultado do exercício, mas sem dedução de eventuais perdas apuradas no cálculo do lucro real. A nova forma de tributação proposta pela MP nº 897, contudo, foi vetada pelo presidente da República e, como consequência, a tributação segue conforme a carga ordinariamente aplicada, que chega a 34%, considerando o IRPJ (15% normal + 10% adicional sobre o lucro real que excede R$ 20 mil) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), de 9%.

O insucesso na redução da carga tributária aplicável ao emissor primário, que é o produtor ou importador de biocombustível, representa mais um desafio e afeta diretamente o estímulo de emissões de CBIOs e, consequentemente, os custos dos consumidores e engajamento para proteção do meio ambiente.

A expectativa é de que, apesar dos desafios enfrentados atualmente, as negociações de CBIOs decolem a partir de agora, permitindo que o Brasil esteja apto a oferecer no mercado financeiro um ativo ambiental que dê suporte ao projeto do RenovaBio como maior programa de descarbonização do mundo. O mercado de CBIOs representa, assim, uma das soluções para a economia de baixo carbono que as grandes empresas estão procurando.

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