Em dezembro de 2024, a Lei nº 5.991/1973 completa 51 anos. Trata-se de uma das leis mais antigas relativas à vigilância sanitária ainda em vigor, que instituiu o marco legal no país para o comércio de produtos sujeitos à legislação em saúde.
A Lei nº 5.991/1973 é responsável por trazer conceitos basilares relativos ao comércio e à assistência farmacêuticos, estabelecendo definições para medicamento[1], farmácia[2], drogaria[3], dispensação[4] etc., além de direitos e deveres dos diversos agentes envolvidos, inclusive quanto ao licenciamento e apontamento de responsáveis técnicos.
Conforme as definições estabelecidas pela norma, à época, as drogas[5] eram comparáveis aos insumos farmacêuticos ativos, e os correlatos[6] abrangiam categorias regulatórias hoje independentes, como cosméticos[7], saneantes[8] e produtos veterinários[9] – os últimos sequer regulados pela Anvisa atualmente.
Posteriormente foi publicada a Lei nº 6.360/1976, que dispõe sobre a vigilância sanitária a que ficam sujeitos os medicamentos, as drogas, os insumos farmacêuticos e correlatos, cosméticos, saneantes e outros produtos. A norma já traz maior divisão a tais categorias regulatórias, definindo também os perfumes[10], produtos de higiene[11], além de esmiuçar conceitos variados pertinentes aos medicamentos.
A Lei nº 6.360/1976 detalhou e atualizou também as obrigações e procedimentos correspondentes aplicáveis aos estabelecimentos que manejam produtos sujeitos à vigilância sanitária, como o registro de produtos e estabelecimentos, o apontamento de responsáveis técnicos, o controle de qualidade.
Ainda, a Lei nº 5.991/1973 estabelece noções de fiscalização e amostragem de produtos antecedentes às Leis nº 6.360/1976 e nº 6.437/1977, que as complementam e fixam infrações à legislação sanitária federal e, a última, as sanções correspondentes.
Hoje, para além das categorias regulatórias estabelecidas pela Lei nº 5.991/1973 e detalhadas pela Lei nº 6.360/1976, há noções e produtos cada vez mais inovadores que requerem a constante atualização da legislação em saúde, incluindo os softwares como dispositivos médicos (SaMD), tintas com ação saneante, produtos de cannabis.
Isso sem contar os produtos “fronteira”, cujo enquadramento regulatório nas categorias atualmente existentes, conforme exploradas acima, não se mostra tão claro. Por isso, a Anvisa criou em 2016 o Comitê de Enquadramento de Produtos sujeitos à Vigilância Sanitária (Comep) e inclusive adicionou aos temas da sua Agenda Regulatória 2024-2025 o Tema 1.25 - Procedimentos para o enquadramento de produtos fronteira.
Especificamente em relação à dispensação e comercialização de produtos e à prestação de serviços farmacêuticos em farmácias e drogarias, a RDC Anvisa nº 44/2009 atualiza as disposições da Lei nº 5.991/1973, conferindo-lhes mais especificidade e profundidade.
Ainda assim, atualmente tais normas encontram-se defasadas, notadamente quanto à plena regulação de novas situações trazidas pelo avanço da tecnologia, como os serviços de entrega e marketplaces.
O próximo grande passo para atualização do arcabouço regulatório contemplado pela Lei nº 5.991/1973, portanto, consistirá na revogação da Seção V, Subseção I, da RDC Anvisa nº 44/2009, que trata da solicitação remota para dispensação de medicamentos, e na publicação de instrumento normativo específico para regulamentar o assunto.
A iniciativa faz parte do Tema 1.2 da Agenda Regulatória 2024-2025 da Anvisa. A Anvisa formalizou o Termo de Abertura de Processo nº 34/2022 em 02/04/2022 para dar início ao processo administrativo de revisão da RDC Anvisa nº 44/2009.
Desde então, até a presente data, o processo se encontra na etapa de Análise de Impacto Regulatório (AIR), a qual está prevista para terminar no segundo trimestre de 2025. A AIR consiste em um procedimento de avaliação prévia à edição de ato normativo que visa a trazer informações sobre os prováveis efeitos, verificar a razoabilidade do impacto e subsidiar a tomada de decisão.
As próximas etapas consistirão na elaboração da minuta do novo texto regulatório, seguida de Consulta Pública, prevista para ser concluída no terceiro trimestre de 2025 – mecanismo de participação social por meio do qual a sociedade é consultada previamente sobre proposta do ato normativo.
Posteriormente, a Anvisa poderá, ainda, realizar Audiência Pública para apoiar a tomada de decisão sobre a matéria e, por fim, a última etapa consistirá na deliberação da proposta em reunião pública da Diretoria Colegiada da Anvisa (Dicol), prevista para ocorrer no quarto trimestre de 2025.
Dessa forma, espera-se que, para o 52º aniversário da Lei nº 5.991/1973, essa importante atualização seja implementada, sem prejuízo dos naturais avanços tecnológicos envolvendo todas essas categorias de produtos.
Por: Marco Aurélio Torronteguy, Giovana Salerno Soares e Victor Hugo Callejon Avallone, respectivamente sócio, advogada e advogado na área de Ciências da Vida e Saúde de TozziniFreire